No dia 7 de Fevereiro de 2022, o mundo se despediu de um dos maiores mestres dos efeitos especiais da história da cinema: Douglas Trumbull, que proporcionou seu talento e visão a grandes clássicos como Blade Runner (1982) e Contatos Imediatos do Terceiro Grau (1977) .
O Início
Ainda criança, Douglas tomou gosto pelos filmes com temática espacial. Longas que narravam invasões alienígenas como O Dia Em Que a Terra Parou (1951), Planeta Proibido (1956) e Vampiros de Almas (1956) inspiravam o futuro especialista a construir seus próprios dispositivos extraterrestres de brinquedo. Certamente, seu pai Donald, engenheiro mecânico que desempenhou a futura função do filho em produções como O Mágico de Oz (1939), exerceu uma importante influência nas criações do pequeno artista, que durante a adolescência chegou a considerar ser arquiteto.
No início dos anos 1960, Douglas trabalhou em To the Moon and Beyond, um cinerama (processo que consiste na exibição de 3 filmes de 35mm sincronizados lado a lado em uma imensa tela curva widescreen) mostrado na Feira Mundial de Nova Iorque de 1964. A experiência narrada por Rod Sterling com trilha sonora de Gerald Fried retratava uma viagem de ida e volta à Lua. Diferente das versões mais comuns de cinerama, To the Moon and Beyond foi gravado em um único filme de 70mm, exibido em uma imensa tela abobadada.

Um Convite Estelar
Impressionado pelas realizações de Douglas, um diretor de cinema em franca ascensão que acabara de transferir a produção de seu mais novo trabalho dos Estados Unidos para a Inglaterra o procurou afim de ofertar a vaga de supervisor de efeitos visuais para um filme que retrataria viagens através do espaço.
Seu nome era Stanley Kubrick.
2001: Uma Odisseia no Espaço foi uma realização extremamente ambiciosa, que contava com imensos sets giratórios projetados por engenheiros aeronáuticos e um extenso uso de maquetes gigantes e gruas automatizadas que tornaram possível a captação das infinitas tomadas que Kubrick é famoso por repetir à exaustão. A riqueza de detalhes na construção das naves chamava a atenção por ser intensa, imersiva e possuir um design verossímil, que sob consultoria de especialistas como Carl Sagan, precedia até mesmo o pouso do homem na Lua, que só viria ocorrer 3 meses após o lançamento do filme. Sequências clássicas de combate cosmonáutico como a da Estrela da Morte em Star Wars só se tornaram possíveis graças ao trabalho de Trumbull.
Depois da parceria com Kubrick, Douglas trabalhou com outro diretor lendário: Robert Wise.
O Enigma de Andrômeda, baseado em um romance de Michael Crichton (que também escreveu os materiais usados como base para Jurassic Park e Westworld), trazia a já característica visão de futuro de Trumbull: ambientes grandiosos, luzes e formas circulares. Foi também nessa época que Alejandro Jodorowsky tentou convocar Trumbull como um de seus Guerreiros Espirituais para a realização de sua megalomaníaca versão de Duna que nunca chegou a ver a luz do dia e originou o clássico das graphic novels Incal.

Técnicas
A maestria com a qual Douglas Trumbull conseguia criar visuais extremamente críveis carregados de dramaticidade lhe rendeu participação em inúmeros outros clássicos.
Em Contatos Imediatos do Terceiro Grau, além de cenas feitas em locações reais, maquetes foram construídas com terra na intenção de imitar montanhas, que tinham os horizontes representados por pinturas posicionadas ao fundo. Carros e casas em miniatura compunham os cenários e tudo era idealizado e executado através de perspectiva forçada conforme ângulos encomendados por Steven Spielberg. Movimentos de câmera precisos eram primordiais, e reflexos de lente também foram explorados.
Com tudo isso preparado, os cenários eram inseridos nos filmes através de Projeção Traseira, técnica utilizada até hoje na qual os atores contracenam na frente de uma imensa tela que projeta o cenário; muito comum em cenas que se passam no interior de carros em movimento, por exemplo.
Na construção os OVNIs, plástico e plexi glass recheados de neon dispostos de maneira que se assemelhassem a rostos. A visão “otimista” pretendida por Spielberg na abordagem do assunto extraterrestre buscou criar naves estranhas, porém “carismáticas”.
Para criar as espessas e volúveis nuvens, foram usados um tanque de água e tinta. Dentro do tanque, eram misturadas água salgada gelada e água potável morna; desta forma, a diferença nas densidades exerciam sobre a tinta um processo parecido com o que acontece de fato com as nuvens de verdade na atmosfera.
Trumbull explicou em uma palestra no Toronto International Film Festival que as técnicas empregadas em Blade Runner foram basicamente as mesmas, mas com muito menos tempo e dinheiro; entretanto, a experiência anterior tornou o trabalho possível com um esforço menor.

Showscan
Após o sucesso de 2001, Contatos Imediatos e Star Trek, Trumbull desenvolveu uma tecnologia chamada Showscan, que basicamente consistia em captar cenas em 70mm a 60 quadros por segundo (contra os tradicionais 24 do cinema). Segundo Trumbull, apesar do público estar acostumado e associar a estética dos 24 quadros por segundo ao cinema, muito se perdia por conta dos borrões em cenas mais agitadas, já que mais da metade da ação não era registrada devido aos momentos em que o obturador da câmera se fechava entre as trocas de quadro.
Em 1983, Trumbull fechou contrato com a MGM para dirigir Brainstorm. A ideia era que as sequências de realidade virtual fossem capturadas com o uso do Showscan; mas o excesso de custos e complexidade da produção fizeram com que a MGM voltasse atrás vetasse a ideia. Brainstorm foi, então, filmado em 35 e 70mm convencionais.
Dez anos mais tarde, Douglas Trumbull e seu colega de trabalho Edmund DiGiullio receberam um Oscar pela colaboração científica à sétima arte.
