No último dia 26, completamos mais uma volta em torno do Sol depois que Ladislav Loewenstein nasceu no extinto Império Austro-Húngaro, mais precisamente na região de Ružomberok, hoje território da Eslováquia.
Depois de perder os pais muito cedo, Ladislav fugiu de casa ainda adolescente motivado pela má relação que mantinha com sua madrasta, passando por diversas capitais da Europa e se sustentando através de subempregos enquanto perseguia a carreira de ator. Foi nessa época que adotou o nome artístico de Peter Lorre, motivado pela sua semelhança com Struwwelpeter, personagem da literatura infantil alemã que assim como o ator, possuía enormes olhos expressivos.

Em 1928, aos 24 anos de idade, finalmente chegou a Berlim, onde se afiliou a grupos de teatro e trabalhou com o dramaturgo alemão Bertold Brecht. Foi justamente atuando em uma de suas peças, Despertar da Primavera, que Lorre foi descoberto pelo lendário cineasta Fritz Lang, que se encantou pelo seu olhar característico e o julgou perfeito para sua próxima empreitada.

M (1931)
O primeiro filme sonorizado de Fritz Lang foi também o responsável por alçar Lorre ao estrelato. No longa, uma cidade alemã vive noites de medo e terror, assombrada pela presença de um assassino que captura e mata crianças, o que leva tanto a população quanto o crime organizado às ruas à caça do assassino, trazendo à tona discussões sobre justiça, o papel da polícia, linchamento, justiçamento de rua e seus interesses.
Além da exímia atuação de Lorre, que demonstra grande domínio de expressões faciais e corporais, transparecendo com clareza os inúmeros conflitos e situações que seu personagem vivencia, M faz criativo uso do som, até então novidade, com extrema maestria, misturando vozes, ruídos, música e imagem, botando em prática técnicas cinematográficas de narrativa visual que estão em uso até os dias atuais, consolidando-o como um dos maiores filmes de serial-killer da história.
Devido à sua origem judaica, Lorre teve diversas cenas suas recortadas do filme e usadas fora de contexto como material de propaganda nazista nos anos seguintes.
Ao se afastar da Alemanha devido à Segunda Guerra Mundial, Lorre trabalhou com Alfred Hitchcock ainda na Inglaterra, em O Homem Que Sabia Demais (1934) e Agente Secreto (1936), que abriram portas nos Estados Unidos.
No continente norte-americano, Lorre trabalhou com Bela Lugosi e Boris Karloff na comédia O Castelo dos Mistérios em 1940, e viria a fazer parte do premiadíssimo Casablanca em 1942. Entretanto, eu gostaria de destacar outra obra estadunidense.

O Falcão Maltês (1941)
Adaptação do livro de mesmo nome, o longa dirigido por John Huston e estrelado por Humphrey Bogart e Mary Astor é uma clássica história noir, a primeira de tantas protagonizadas pelo galã nova-iorquino.
Sam Spade e seu sócio Miles Archer são detetives particulares contratados por uma mulher que busca sua irmã perdida. O caso se complica quando o Archer é encontrado morto e a contratante desaparece. A partir daí, uma rede de acontecimentos começa a se entrelaçar, trazendo mais pessoas e elementos para dentro do caso.
Com uma narrativa ágil e detalhada, O Falcão Maltês foi indicado a três Oscars e marcou a estreia de Huston na direção, sendo considerado por muitos o primeiro grande filme noir da história, reunindo importantes características do estilo como a fotografia em preto e branco de alto contraste, o protagonista de índole questionável, a Femme Fatale, e o ambiente urbano.
Aqui, Peter Lorre atrai para si todas as atenções nas cenas em que aparece interpretando o excêntrico Joel Cairo, que trará uma nova tarefa para Sam Spade. Com sua fala cadenciada e gestos repletos de nuances, o ator é preciso até mesmo no modo como direciona o olhar, ilustrando todas as camadas de um personagem tão complexo.
Vale ainda citar que Lorre viveu a primeira encarnação de Le Chiffre, clássico vilão da franquia James Bond, em uma adaptação para a TV de Casino Royale em 1954. Anos mais tarde, o personagem seria interpretado por outros dois gigantes: Orson Welles na versão de 1967, e Mads Mikkelsen em 2006 no primeiro longa de Daniel Craig no papel de James Bond.
Lorre faleceu em 1964 aos 59 anos, em decorrência de um AVC. Em seu funeral, que seguiu o costume judaico, Vincent Price foi responsável pelo encômio, enfatizando a grande amizade entre os dois.
