É tempo!

No próximo domingo, dia 2 de Março, acontece a 96ª Cerimônia do Oscar e os brasileiros nunca tiveram tanto motivo pra torcer, pois Ainda Estou Aqui, de Walter Salles, concorre aos prêmios de Melhor Filme e Melhor Filme Estrangeiro, além de, é claro, a nossa queridíssima Fernanda Torres, que figura entre as cinco indicadas à estatueta de Melhor Atriz.

Como de costume, tentei rankear os 10 longas pela ordem da minha preferência pra vocês verem no que deu. Vale lembrar, antes de mais nada, que eu não possuo formação alguma em crítica, cinema, ou qualquer coisa do tipo. A lista é puramente baseada no meu gosto pessoal e eu posso mudar de idéia momentos depois de postá-la.

Enfim, me contem quais filmes já viram, quais querem ver, quais odiaram, pois eu quero saber. No mais, vamos lá:

10. Emilia Pérez

Talvez o caso mais memorável de derretimento de um filme ao longo de sua campanha na temporada de premiações.

Emilia Pérez é um musical francês, interpretado majoritariamente por estadunidenses e que se passa no México onde Manitas Del Monte (Karla Sofía Gascón), um poderoso chefe de Cartel, recruta a advogada Rita Mora (Zoe Saldaña) para que ela cuide de assuntos legais acerca de sua cirurgia de readequação sexual.

Com exceção da performance de Gascón (desconsiderando as partes cantadas, o que pode ser questionável em um musical) e do interessante uso de sombra e luzes coloridas, é difícil compreender as treze indicações ao Oscar que o filme recebeu, pois além das sofríveis demais atuações, diversos assuntos que a obra levanta são tratados de maneira rasa ou abandonados pelo caminho sem qualquer consequência, e quando não, são apenas desrespeitosas e estereotipadas.

Fica, pelo menos, o reforço ao conceito de que o que vence Oscar não é qualidade – até porque, existe um nível onde a qualidade da arte passa a ser cada vez mais subjetiva -, e sim campanha.

Foto: Reprodução

9. Wicked

Este que vos escreve definitivamente não é um fã de musicais no cinema, mas as quase três horas de Wicked, baseado na atração teatral que dá vida ao livro de Gregory Maguire entregam com precisão os elementos que compõem a história e a mística em volta do espetáculo da Broadway e O Mágico de Oz. Direção de arte, figurino, efeitos especiais, fotografia, tudo nutre as excelentes performances de Ariana Grande e, especialmente, da imponente Cynthia Erivo (intérprete de Elphaba, a Bruxa Má do Oeste, que aqui tem expressa a origem de sua vilania), que demonstram pleno entendimento de suas personagens e esbanjam química ao dividir a tela em cenas e diálogos bastante desenvolvidos.

O longa de Jon M. Chu é um perfeito exemplo de como uma história modesta pode se engrandecer pelo modo como é contada, pois tudo nessa obra poderia cair na mesmice Hollywoodiana que presta tributo ao conceito clássico de espetáculo valendo-se unicamente de grandeza. Wicked passa longe disso, adicionando camadas de criatividade com o uso de sutileza, cores, luzes e sombra, sabendo sempre para onde atrair o olhar do espectador.

Foto: Reprodução

8. Um Completo Desconhecido

Aqui, acompanhamos a carreira de Bob Dylan desde 1961 até as vésperas do lançamento de Highway 61 Revisited, e conhecemos também outras personalidades que orbitaram sua vida ao longo dos anos, como Joan Baez (Monica Barbaro, indicada ao Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante) e Pete Seeger (Edward Norton, indicado ao Oscar de Melhor Ator Coadjuvante), seu descobridor, por assim dizer.

Logo no início, vemos Bob com seu violão no hospital, tocando para Woody Guthrie, seu maior ídolo, que convalesce. A excelente performance de Timothée Chalamet, que praticou por cinco anos antes das gravações para tocar e cantar como Dylan nos mostra tudo o que é necessário para entendermos a relevância do cantor e compositor. A construção das cenas musicais são habilmente pensadas para irradiar a música folk e o que Bob Dylan representa e ocasiona na arte.

É interessante também acompanhar a construção da mística em volta do cantor, que parece não saber lidar consigo mesmo e muito menos com os demais sem que esteja empunhando seu violão. Sempre alheio, é decifrado por seus interesses amorosos como um completo desconhecido. A conexão com Baez, que passa por altos e baixos, exibe seus melhores momentos através dos olhares e das harmonias vocais quando tocam juntos.

O filme de James Mangold (indicado à Melhor Direção) vai além de querer retratar a vida do artista através dos clichês da pessoa complexa centralizando-a em polêmicas, procurando desenvolver ao invés disso o ecossistema da música folk e como um influenciou ao outro, ainda encontrando tempo para discorrer sobre a escolha de direção que o artista resolve tomar frente às expectativas do público e do mercado fonográfico.

Foto: Reprodução

7. Duna: Parte 2

Quando Duna foi lançado em 2021, percebia-se uma certa preocupação por parte de realizadores e fãs para que novos espectadores entendessem que aquela era só a primeira parte da jornada de Paul Atreides (Timothée Chalamet). Personagens extremamente importantes como Feyd-Rautha (Austin Butler) e a Princesa Irulan (Florence Pugh), além das grandes e decisivas batalhas comumente atreladas a épicos cinematográficos só dão as caras na sequência.

Em Duna: Parte 2 o diretor Denis Villeneuve traz à tela a segunda parte do livro de Frank Herbert, um dos maiores pilares da ficção científica, e entrega toda a urgência diminuta em boa parte do capítulo anterior.

Indiscutivelmente superior à primeira parte, Duna: Parte 2 explora as consequências do desejo e da obtenção de poder, bem como a mera posse da autoridade pode ser usada como ferramenta de controle.

Aqui, a discutível tendência da dessaturação das cores joga a favor, retratando a situação do planeta Arrakis e de seus povos, somando à mística da especiaria, dos rituais, e dos lindos e imponentes figurinos.

Foto: Reprodução

6. Nickel Boys

O longa da RaMell Ross narra o nascimento da amizade entre os jovens Elwood (Ethan Herisse) e Turner (Brandon Wilson) dentro do reformatório Nickel Academy, possuindo uma característica pouco usual: quase todo o filme é visto em primeira pessoa.

Ao fixar o ponto de vista nos olhos dos protagonistas, Nickel Boys escolhe para onde quer ou não olhar, e busca não só nos fazer sentir, mas entender também o que ele pensa, criando paralelos entre sua realidade e a arte que ele aprecia, conversas e observações, analisando quanto o meio em que vive influencia no seu entendimento do mundo. Outra característica interessante da câmera em primeira pessoa, é como os elementos de cada situação se montam, desde a ordem dos acontecimentos, elementos no cenário, sons, até a iluminação e as cores, exercendo a função de, literalmente, nos colocar na pele do personagem para o mal ou para o bem, buscando uma sensação diferente da que usualmente nos é condicionada.

Nickel Boys conta ainda com uma discreta, porém pujante atuação de Hamish Linklater no papel do diretor abusivo da instituição, que transparece os ossos obscuros daquilo que considera seu ofício sempre amparado nos tais valores de bem.

The game is rigged.

Foto: Reprodução

5. A Substância

A Academia de Artes e Ciências Cinematográficas gosta de tratar filmes de terror da mesma maneira que aquele cara que finge ser amigo da turma trata você: pode ser que admire em segredo, mas publicamente trata com desdém por se julgar superior enquanto inveja suas conquistas. Embora figure na categoria de Melhor Filme e a protagonista Demi Moore lidere as previsões para Melhor Atriz, A Substância ainda tem seu gênero como entrave para a ala mais conservadora dos votantes, que o consideram ostensivo demais.

Extremamente atemporal na discussão que propõe, repleto de alegorias e audacioso com o que coloca na tela, o longa de Coralie Fargeat (indicada ao Oscar de Melhor Direção) mostra Elisabeth Sparkle (Moore), uma condecorada estrela de Hollywood e apresentadora de TV do meio fitness ser trocada feito mercadoria quando atinge os cinquenta anos de idade. É então que uma empresa misteriosa lhe oferece a possibilidade de se tornar a melhor versão de si mesma fazendo uso da substância que dá nome ao filme. Repleto de soluções práticas devido ao orçamento modesto, a obra suscitou discussões acerca da verossimilhança dos eventos. Embora isso seja assunto para um outro texto, prefiro concordar com a frase atribuída a Stanley Kubrick:

Real é bom, mas interessante é melhor.

Com claras referências a clássicos do terror como O Iluminado (1980, Stanley Kubrick), A Substância exprime o quão hediondo o show business pode ser com as mulheres, acarretando até mesmo numa distorção da imagem que elas têm de si, representadas pelo nojo e desconforto do horror corporal.

Foto: Reprodução

4. Conclave

Baseado no livro de Robert Harris lançado em 2016, Conclave acompanha um… conclave.

Após a morte do Papa, cardeais do mundo todo se reúnem no Vaticano para a eleição do próximo sumo pontífice, e fica a cargo do decano inglês Thomas Lawrence (Ralph Fiennes, indicado a Melhor Ator) organizar a votação. Cabe aqui, inclusive, a curiosidade de que no romance o personagem principal na verdade é italiano, e se chama Jacopo Lomeli, mas a mudança de cidadania rendeu um BAFTA, então quem somos nós para discordar?

Como esperado, o filme perde muito conteúdo em relação ao livro por questões de tempo, e muitas das discussões e guinadas da história acabam parecendo óbvias e rasas, pois inúmeros arcos que no livro são longos e exaurem os envolvidos, no filme parecem se resolver quase que instantaneamente, e pontos de vista dos diferentes candidatos a Papa desenvolvidos aos poucos no material original acabam tendo de ser condensados em discursos únicos.

Entretanto, o longa de Edward Berger escolhe um caminho alternativo e extremamente assertivo que faz de Conclave o bom filme que é: a ambiência.

Repleto de B-Rolls – aquelas filmagens complementares muitas vezes sem diálogos que mostram cenários e pessoas, de longe, simplesmente vivendo suas vidas -, Conclave nos tranca dentro da Casa de Santa Marta junto dos cardeais e nos coloca na posição de espiões, como se ouvíssemos pelos cantos o que acontece nas suntuosas instalações, constantemente mostradas em planos super abertos.

É impossível também deixar de ressaltar a trilha sonora de Volker Bertelmann. Extremamente tensa, serve como condução perfeita para um evento que abertamente coloca a política interna da igreja católica acima da espiritualidade e dos ensinamentos de Jesus Cristo.

Foto: Reprodução

3. Ainda Estou Aqui

Então quer dizer que você não está torcendo pelo Brasil?!

Eu estou torcendo pelo Brasil. Mesmo que eu vá ficar feliz caso algum outro filme que eu goste ganhe, com certeza a minha torcida é uma só nas categorias que o nosso longa concorre. A lista é só questão de gosto.

Baseado no livro de Marcelo Rubens Paiva e dirigido por Walter Salles, Ainda Estou Aqui narra como o engenheiro Rubens Paiva foi raptado pela ditadura militar brasileira e como isso impactou sua família.

No início, vemos Rubens (Selton Mello), Eunice (Fernanda Torres, indicada ao Oscar de Melhor Atriz) e seus cinco filhos se divertindo na praia, em casa, e recebendo inúmeros amigos para jantares animados. Sempre em pauta, a arte também é muito presente na vida da família através da música, do cinema, da moda e da pintura.

Entretanto, depois que Rubens é levado para prestar depoimento, Ainda Estou Aqui praticamente se torna um filme de terror. As cores, a música, tudo some, dando lugar a um silêncio apagado, sepulcral, e ao medo de simplesmente existir. A crescente ausência de Rubens funciona quase como uma assombração, e Eunice precisa proteger os filhos do desmonte da felicidade ao mesmo tempo que luta na justiça contra os donos do jogo para entender o que houve com o marido.

O fato do longa ter sido filmado em ordem cronológica e o extenso tempo para pré-produção e ensaios, algo extremamente incomum por questões de custo, foi vista pelo elenco como uma ferramenta fundamental na construção da história. A excelente atuação de Fernanda, que com certeza merece o Oscar no âmbito artístico – razoavelmente irrelevante para a Academia -, mostra uma total compreensão da situação por parte de Eunice, que transforma medo e tristeza em força para conseguir seguir estável e proteger os filhos.

Foto: Reprodução

2. O Brutalista

No longa de Brady Corbet (indicado ao Oscar de Melhor Direção), acompanhamos por mais de três horas a história de László Toth, arquiteto húngaro que migra para os Estados Unidos após o fim da Segunda Guerra Mundial.

Num primeiro momento, ele busca a ajuda de seu primo Attila, que administra uma loja de móveis e não só se converteu ao catolicismo como também mudou seu sobrenome para Miller, buscando se mesclar aos estadunidenses. As coisas pareciam ir bem, mas as duras penas da nova vida na América atingem Toth sem dó.

Tudo no filme, desde duração, edição, atuações e trilha sonora, o moldam como uma obra pertencente à estética brutalista, caracterizada pelas suas construções enormes, pesadas, repletas de formas geométricas agressivas. O formato VistaVision, que captura a imagem na película de 35mm de forma horizontal e não no tradicional vertical, trabalha a favor da grandiosidade. Até mesmo a intermissão inserida no meio do filme faz parte da montagem, estendendo-se por 15 minutos contados em tela. A moldagem de O Brutalista funciona como uma representação viva do movimento arquitetônico que aborda, tornando-o uma experiência única.

O trabalho de Adrien Brody (indicado ao Oscar de Melhor Ator) é intenso e abrange diversas situações e emoções. Muitos acreditam que atuações premiadas são aquelas que esbanjam sofrimentos, caras e bocas – e como Toth sofre, viu? E nos faz sofrer junto! -, mas ele também passeia pela felicidade, ambição, cinismo, trauma, luto…

Supere o medo de filmes de mais de 90 minutos e assista a O Brutalista.

Foto: Reprodução

1. Anora

Sean Baker (indicado ao Oscar de Melhor Direção), o destruidor de sonhos, ataca novamente.

Em Anora, somos apresentados a uma stripper – e ocasionalmente garota de programa – da noite novaiorquina escalada para atender um cliente russo que por acaso, é herdeiro de uma família multimilionária.

Totalmente inconsequente, o garoto traga Anora para um mundo de festas infinitas, bebedeiras e viagens, o que o torna, aos olhos dela, uma passagem para o bendito sonho americano. Entretanto, quando os pais do garoto descobrem a mais nova peripécia do filho, embarcam da Rússia para os Estados Unidos e botam subordinados atrás do casal a fim de anular o quanto antes o matrimônio firmado em Las Vegas.

Quase como num conto de fadas ou Uma Linda Mulher às avessas, vemos Anora se agarrar à nova vida de mentira que escorre pelos seus dedos. A passividade de seu noivo mostra que os rios deságuam nos mares: não há espaço para o ganho ou ascensão social a não ser que você já seja dono da maior parte. Anora é uma mulher extremamente forte, mas mesmo toda a proteção que construiu ao redor de si pode acabar ruindo com o impacto das insistências da vida real.

Além das cenas e diálogos extremamente bem-construídos e por vezes bastante caóticos, Anora conta com grandes atuações, com destaque para Mikey Madison (a Anora, indicada a Melhor Atriz) e Yura Borisov (Igor, um dos capangas do pai do noivo, indicado a Melhor Ator Coadjuvante). Vale salientar também que um dos maiores méritos do roteiro é o de não tratar a profissão da protagonista com moralismo em momento algum.

Foto: Reprodução

E aí? Sua lista é igual a minha? É tudo ao contrário? Me conta!

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No mais, nos vemos no próximo domingo, em clima de Copa do Mundo, para torcer pelo nosso filme.

Além destes textos sobre cinema, música, games, literatura e etc., também escrevo ficção. Conheça meus contos aqui:

https://siudincident.com.br/category/contos/

Obrigado pelo seu tempo, paciência e atenção.